Maria Clara

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Crônica de Luiz Carlos Seixas

Maria Clara começou hoje como garçonete nesse bar que eu frequento enquanto o sol se põe. Pelo empenho que ela dedica a tudo que faz, deve ser o seu primeiro emprego. Aliás, se não trabalhasse das 18 às 23 horas, eu desconfiaria da sua maioridade. Assim, Maria Clara deve ter lá os seus 18 anos, calça 38 e mora longe.

Ela parece alta quando me abastece de chope, mas, reparando melhor, a sua magreza é ainda maior. Vê-se que não é uma magreza por opção, resultante de regimes ou academia. Ela arrasta consigo aquela indisfarçável imagem de quem não se alimenta bem. Maria Clara não é fitness, ela é magra. Magra como talvez não quisesse ser. Não é alegre nem é triste essa moça no seu primeiro dia de trabalho. Ela é só concentração e sabe que não pode falhar.

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Luizinho, o onipresente dono do bar, carrega esse sufixo diminutivo no próprio nome mas comanda o negócio como maestro de uma grande orquestra. Uma orquestra frenética de Recife no Carnaval que veio dar num bairro popular dessa curva de rio. É frevo das 18 às 23 horas, embora a música ambiente seja desastrosamente outra: melosa, sertaneja e universitária. E entre barbas desenhadas e o cabelo dos artistas, Maria Clara sabe que para continuar empregada ela precisa entrar no ritmo do frevo que vem lá da cozinha.

Foi numa dessas idas e vindas que uma comanda caiu da bandeja onde Maria Clara levava quatro canecas de chope. Ela não devia se agachar para pegar a comanda, eu pensei, temendo pela integridade das canecas. Como ela foi mais rápida do que eu, só me restou torcer. E foi nesse minuto de torcida e sorte que pude notar o estado lastimável do seu calçado. E por certo ele não estava naquele estado porque é moda, como hoje uma calça esgarçada custa o preço de uma calça nova. Era um par de tênis destruído nas ruas encardidas de onde deve ter vindo essa menina para o seu primeiro dia de trabalho. Aposto como Maria Clara é a caçula que herda dos irmãos a calça larga e um tênis sujo.

Quando o sol se foi por trás das chaminés das olarias de outros tempos, Maria Clara me trouxe a saideira. E eu então aproveitei para perguntar o seu nome.

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