Neuci Martins: Uma guerreira ourinhense

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Publicado em 08/03/2018 | por Bernardo Fellipe Seixas

No Dia da Mulher, o Jornal Biz presta homenagem a todas as leitoras com uma reportagem com Neuci Martins, 44 anos, empregada doméstica com 4 filhos.

A casa fica na última rua do CDHU, num dos extremos da cidade, não muito distante do Rio Pardo. A placa fixada no muro indica que ali “vende-se tempero”. No final da tarde, vizinhos colocam cadeiras na calçada, buscando algum alívio para o calor intenso. É ali que mora Neuci Martins.

Neuci viveu dos 3 aos 12 anos no Lar das Meninas. A instituição, que não existe mais, funcionava na Vila Margarida, e era administrada pela Igreja Metodista. A irmã Rosana, um ano mais velha, também morou lá. Apesar da distância da mãe, que só via aos finais de semana, ela guarda boas lembranças daquele período e alimenta o desejo de reencontrar as meninas com quem conviveu.

“Eu gostava muito das festas, principalmente da junina”, lembra Neuci. Ela diz que eram muitas as meninas e todas muito bem tratadas. Além da escola, também frequentavam a igreja. Das pessoas que trabalhavam no Lar, é da “tia Cida da cozinha” que se recorda com mais carinho. “Não sei ela está viva, eu ficava muito tempo ao lado dela na cozinha, e gostaria de revê-la”, conta Neuci lembrando de quando fuçava nas panelas, fazia pão, e garante: “Fui feliz lá”.

Neuci com sobrinhos e o filho Yago, de camiseta branca.

Quando completou 12 anos foi morar com uma família em Praia Grande. Ela ajudava nos afazeres da casa e a cuidar do filho do casal. Embora tenha sido tratada muito bem pela família e do incentivo para que continuasse estudando, ela reconhece, com bom humor, que era uma adolescente rebelde: “Mas nem tanto. Nunca usei drogas. Ofereceram, mas nunca tive curiosidade”.

De volta a Ourinhos, foi viver com a mãe no Parque Pacheco Chaves. A essa altura, a irmã, com 17 anos, já tinha uma filha de dois anos. Ela teve seu primeiro filho aos 19, e diz categórica: “Eu quis ter esse filho”. Depois foi morar em Palmital. A segunda gravidez veio quando o filho Rafael tinha apenas 4 meses: “Eu tinha dois bebês”. Neuci foi morar com pai das crianças e a relação durou 5 anos. Quando ele a deixou, ela estava grávida novamente.

Foi aí que percebeu que teria de criar os filhos sozinha. Reconhece a ajuda que recebeu da prefeitura e dos vicentinos: “Muitas vezes eles pagaram meu aluguel, ou outras contas da casa”. Mas sempre teve de batalhar muito para educar os filhos. “Tem mulher que acha que trata de filho com pensão, mas se não correr atrás eles passam fome”. Neuci não esconde que nenhum dos pais esteve presente na educação e nem ajudaram financeiramente além da pensão obrigatória.

“Tive que dar conta sozinha. É duro, mas eu tenho força de vontade e coragem para trabalhar.” E novamente com o sorriso que a acompanha constantemente, ela diz: “Só ia viver de pensão se eu tivesse um filho com o Neymar…!”

Aniversário de 12 anos de Yago, o filho caçula, abraçado ao pai, Ronaldo.

Quando vai explicar o segredo desse bom humor, é Yago, o filho mais novo, que intervém, denunciando: “Bom humor agora, chega aqui de manhã pra ver como ela acorda…!” Como sabe que viver às vezes pode ser bem difícil, Neuci passa longe das lamentações e procura sempre manter a alegria, mesmo diante das complicações do dia a dia:

“Cara feia não paga minhas contas. Não dá pra ficar chorando pelos cantos, a vida é dura pra todo mundo”.

PIX jornalbizness@gmail.com

Neuci sabe que foi criada longe da mãe por circunstâncias adversas, mas que nunca foi abandonada, e atribui a Dona Cida a determinação para sempre proteger os filhos. A mãe observa enquanto Neuci fala, mas mantém um olho no bisneto que brinca por ali. Dona Cida se recupera de um AVC que sofreu recentemente e que ainda causa um pouco de dormência na boca e em umas das mãos. Apesar dos sintomas, a mãe foi mandada de volta para casa depois de passar pela unidade de pronto-atendimento. Falando alto e gesticulando muito, Neuci tenta reproduzir o olhar de espanto do médico diante da sua revolta com o descaso do profissional. Quando se trata de defender a família, Neuci vira uma leoa.

Neuci com as filhas Kamila e Karla.

A maior preocupação com as filhas é que consigam se planejar para ter filhos. Ela lembra o quanto foi difícil criá-las sozinha e para que a história não se repita, ela ensina, certeira: “Acho que a mulher precisa trabalhar e ter sua autonomia, ter o seu dinheiro. Depender dos outros é muito difícil”. Neuci já trabalhou em muitas casas e acredita que as mulheres passam pelos mesmos dilemas:

“Nas casas de famílias muito ricas pode até sobrar dinheiro, mas já vi muita infelicidade. sou feliz com o pouco que tenho”.

Neuci com a mãe e as sobrinhas Taís e Thainá.

Mãe de quatro filhos e uma neta, Neuci diz que nunca foi vaidosa, mas teve seu tempo de forrós e vida mais agitada. Hoje mais tranquila com os filhos já criados, ela vive há 14 anos com o pai de Yago, o filho mais novo. Como a batalha continua, ela segue trabalhando o dia todo, e em casa faz salgadinhos e um tempero muito cheiroso para vender.

A receita do tempero ela não conta, mas a maneira como leva a vida, com o sorriso sempre pronto e o jeito despachado revelam um pouco da coragem e determinação femininas.

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