Nave da Nasa será lançada contra asteroide para tentar mudar sua órbita, em feito inédito

Imagem: NASA, Jack Beyer Spaceflight

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Conteúdo original El País – Madri

A espaçonave Dart vai colidir com Dimorfo para testar um sistema para evitar um impacto capaz de destruir uma cidade inteira

Por volta das 20h desta segunda-feira no horário de Brasília, a 11 milhões de quilômetros da Terra, uma sonda espacial do tamanho de uma geladeira vai colidir de frente e em a toda velocidade com um asteroide de 160 metros de diâmetro. Será a primeira vez que a humanidade tentará mudar o movimento de um corpo celeste, um ensaio geral para evitar impactos futuros que poderiam varrer uma cidade inteira do mapa. O impacto será transmitido ao vivo no canal da agência no YouTube.

Tom Statler, cientista-chefe dessa missão financiada pela Nasa, resume seu objetivo com uma frase de um filme: “Não podemos deixar uma pedra do espaço nos mergulhar de volta à Idade da Pedra.”

A Nasa vai lançar a sonda Dart em missão para colidir contra asteroide e testar defesa da Terra | Imagem: Divulgação / Nasa

Até agora, são conhecidos mais de 95% de todos os asteroides maiores que um quilômetro de diâmetro, capazes de deflagar uma catástrofe planetária semelhante à que resultou a extinção dos dinossauros há 66 milhões de anos.

Mais preocupantes são os corpos de 140 metros ou mais, semelhantes em destruição a uma bomba nuclear e que abririam uma cratera de dois quilômetros de diâmetro. Destes, apenas 40% são conhecidos, o que implica na existência de milhares de projéteis desconhecidos cuja trajetória poderia cruzar nosso planeta em algum momento.

— A probabilidade de você sobreviver ao impacto de um asteroide desse tamanho ao longo de sua vida é aproximadamente a mesma que a de sua casa queimar — explica Statler, astrofísico do Escritório de Proteção Planetária da Nasa, em entrevista por telefone. — Se temos seguro residencial para evitar ficar sem-teto, por que não ficarmos mais bem preparados caso um asteroide venha?

A ameaça é tão significativa que em 2017 a Nasa aprovou o gasto de US$ 324 milhões para tornar essa missão uma realidade.

“Dart” significa dardo em inglês e é a sigla para Double Asteroid Redirection Test (Teste de Redirecionamento de Asteroide Duplo). Foi lançado em novembro de 2021 e atualmente vai na direção de um par perfeito de asteroides para ensaiar seu plano. Trata-se de Dídimo — gêmeo, em grego —, uma rocha de 780 metros de diâmetro, e sua pequena lua Dimorfo, que completa uma volta em torno dela a cada 11,9 horas.

A nave está equipada com um sistema de navegação autônomo que a fará colidir com o centro de Dimorfo a cerca de 22 mil quilômetros por hora. O Dart pesa 570 quilos, cerca de 10 milhões de vezes menos que Dimorfo. Mas, se tudo correr bem, o impacto desacelerará o asteroide e o fará cair levemente em direção a Dídimo, de modo que sua órbita será encurtada em alguns minutos ou, o que daria na mesma, se desviará cerca de 15 metros, segundo Statler.

Pode não parecer muito, mas é uma grande conquista, considerando que ninguém nessa missão sabe como é o asteroide, do que ele é feito ou o quão difícil é a missão porque está tão longe. Para telescópios terrestres, esse par é apenas um pequeno ponto de luz indecifrável.

Espera-se que a câmera do Dart revele a aparência de Dimorfo 45 minutos antes do impacto. A princípio, será um mero pixel de luz, mas nos últimos 30 minutos ficará cada vez maior a cada segundo, tempo em que a sonda captura imagens e as envia de volta à Terra. Em seus últimos momentos de vida, a nave mostrará a superfície de Dimorfo com detalhes suficientes para distinguir pedras do tamanho de uma laranja.

E depois, nada.

A primeira prova de que o Dart atingiu seu primeiro objetivo — colidir com o asteroide — será a perda de sinal. O silêncio será capturado pelo centro de controle, localizado no Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns Hopkins (EUA), e confirmado pelo conjunto de antenas de espaço profundo da Nasa. O impacto é esperado para segunda-feira no Brasil, terça-feira na Europa.




A três minutos do Dart — cerca de mil quilômetros atrás — está o LICIACube, um pequeno satélite desenvolvido pela Agência Espacial Italiana. Esse dispositivo do tamanho de uma torradeira se desligou da sonda principal alguns dias atrás. Após o choque, ele fará uma passagem a 55 quilômetros da superfície de Dimorfo e seguirá por alguns minutos. Não está claro quando as primeiras imagens da cratera e da nuvem levantada pela colisão chegarão.

— Esperamos tê-las um ou dois dias depois, no máximo — explica Stavro Ivanovski, astrofísico da missão.

A trilha de poeira e sujeira levantada pelo Dart atuará como um foguete de reforço para ajudar a desacelerar o asteroide. O telescópio espacial James Web, o Hubble e muitos observatórios terrestres apontarão suas lentes para o par de asteroides para tentar captar detritos do impacto.

Os dois corpos funcionam como um relógio de alta precisão. Quando Dimorfo passa na frente de Dídimo ele produz um pequeno eclipse que acontece com uma cadência perfeita. Nas horas, dias ou no máximo semanas após a colisão, os telescópios poderão confirmar se o Dart conseguiu seu segundo objetivo: mudar a órbita do asteroide.




Mesmo que a missão seja um sucesso, serão necessários anos ou décadas de desenvolvimento tecnológico para poder lidar com uma ameaça real. Um marco importante será alcançado pelo lançamento da Hera, uma missão da Agência Espacial Europeia (ESA) financiada com 130 milhões de euros.

A sonda decolará em 2024 e, dois anos depois, chegará a Dídimo e ao que resta de Dimorfo para segui-los por meses. Essa será a primeira espaçonave capaz de determinar com precisão a massa, composição e estrutura interna desses dois asteroides e realizará uma reconstrução tridimensional detalhada da cratera deixada pelo Dart.

— Precisamos de toneladas de dados para validar essa técnica de desviar asteroides por impacto, e Hera será a missão que nos permitirá desenvolver essa nova tecnologia — explica Ian Carnelli, chefe do projeto.

A ideia é que um sistema como esse esteja pronto em cerca de 30 anos. Se houvesse uma ameaça, uma ou mais sondas de impacto poderiam ser projetadas em dois anos, “um tempo muito curto para os ritmos da indústria espacial”, diz Carnelli.

Tudo isso funcionaria se o asteroide viesse das partes externas do Sistema Solar. No entanto, se vier do lado oposto, na direção do Sol, talvez não possamos detectá-lo até que seja tarde demais. Isso já aconteceu no inverno de 2013, quando um corpo celeste caiu na Sibéria (Rússia), causando mais de mil feridos devido às janelas quebradas. Ele tinha apenas 17 metros de diâmetro.

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