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Apesar das taxas de mortalidade serem baixas, elas são influenciadas pelas condições socioeconômicas
A covid-19 matou, somente este ano, 1.581 jovens entre 10 e 19 anos no Brasil. Apesar de termos cruzado apenas o meio do ano, o número já é mais alto que o total de mortes do até então principal responsável de óbitos por causas naturais (resultantes de uma doença ou um mau funcionamento interno do corpo, não provocado diretamente por forças externas) nesta faixa etária: o câncer, que em 2019 vitimou 1.406 jovens em 12 meses.
Segundo dados dos cartórios de registro civil, até ontem (19), a pandemia matou em média 168 crianças e jovens de 10 a 19 anos por mês no Brasil. Elas representam 0,5% do total dos 543 mil óbitos registrados da doença pelo país.
VivaBem consultou o SIM (Sistema de Informação sobre Mortalidade), do Ministério da Saúde, sobre as mortes nessa faixa etária nos cinco anos anteriores à pandemia (2015-2019) e viu que nenhuma doença ou mesmo conjunto de causas naturais matou tantas crianças e jovens como a covid-19.
O número médio de mortes mensais pela covid-19 só perde para duas causas externas —acidentes de trânsito e agressões— e ultrapassa qualquer doença ou conjunto de doenças.
Média mensal de mortes de mortes (2015-19), segundo o Ministério da Saúde:
- Assassinatos – 803
- Acidente de trânsito – 263
- Cânceres – 124
- Suicídios – 84
- Afogamento – 74
- Doenças do aparelho circulatório – 73
- Doenças do sistema nervoso – 69
- Doenças infecciosas – 52
- Pneumonia – 36
- Doenças do aparelho respiratório – 29
“Esse aumento no número de hospitalizações e óbitos pela covid-19, observado especialmente a partir de fevereiro e março, é reflexo da alta taxa de transmissão comunitária e da circulação de variantes de preocupação em território nacional”, afirma Paulo Martins-Filho, epidemiologista e professor da UFS (Universidade Federal de Sergipe).
Covid-19 em crianças e adolescentes
Segundo o epidemiologista, o que mais chama a atenção é que, apesar das taxas de mortalidade serem baixas, elas são influenciadas pelas condições socioeconômicas.
“Para as crianças, a pandemia também foi associada a profundas mudanças educacionais, sociais e psicológicas, insegurança alimentar e aumento do risco de resultados adversos graves que podem resultar em morte em regiões mais carentes. A mortalidade por covid-19 em crianças em países de alta renda é extremamente rara, mas a doença surgiu como uma nova causa de morte entre crianças em comunidades pobres, conforme observado nas regiões Norte e Nordeste do Brasil”, explica.
Martins-Filho explica ainda que evidências científicas apontam que crianças têm menor suscetibilidade ao Sars-CoV-2.
“Isso ocorre possivelmente devido à diminuição da expressão da enzima conversora de angiotensina 2 [ACE2] nas vias aéreas superiores”, diz. “Nós temos encontrado uma taxa maior de hospitalização especialmente entre aquelas com menos de 2 anos. Resultados semelhantes têm sido descritos em pacientes pediátricos com covid-19 na China, África do Sul e Estados Unidos, por exemplo.”
Ainda de acordo com o professor da UFS, os mecanismos para as diferenças nas manifestações clínicas da covid-19 entre grupos de idade em populações pediátricas não são totalmente compreendidos pela ciência.
“Em relação à covid-19, a presença de condições clínicas preexistentes como obesidade, doenças cardiovasculares, renais e câncer também acabam por aumentar o risco de óbito mesmo em crianças e adolescentes. Além disso, há evidências crescentes de que algumas crianças desenvolvem em decorrência da covid-19 uma reação inflamatória grave e sistêmica conhecida como ‘síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica’, a qual acaba também por acarretar em um maior risco de desfechos graves e mortes nesta população”, diz.
Vacinação
Melissa Palmieri, pediatra e diretora da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações) em São Paulo, diz ver como normal a alta de mortes. “Com um maior número de casos, é fato que nós teremos mais pessoas que podem evoluir com gravidade”, afirma.
“Nesse contexto, essa faixa etária de adolescentes também está inserida. Lógico que a maioria dos desfechos graves estão muito relacionados a casos que tinham comorbidades subjacentes”, explica.
Palmieri diz que ainda estão sendo estudados fatores genéticos específicos que evoluam para desfechos mais grave. Para ela, o essencial é vacinar os grupos com comorbidades na faixa etária de 12 a 17 anos. “O importante é proteger aqueles que sabemos que têm chance de evolução desfavorável pela doença”, afirma.
Um pedido nesse sentido foi feito ao Ministério da Saúde pelo secretário da Saúde do Ceará, Carlos Roberto Martins Sobrinho. Na sexta-feira passada, ele enviou ofício para que a população de 12 a 17 anos com comorbidades e em situação de vulnerabilidade social seja incluída pelo PNI (Programa Nacional de Imunizações).
Atualmente, entre as capitais brasileiras, apenas São Luís começou a vacinar adolescentes abaixo de 18 anos. São Paulo e outras cidades já informaram que pretendem iniciar em agosto a vacinação de adolescentes.
“Embora seja raro em números epidemiológicos, vimos que houve casos em que a doença evoluiu para gravidade. Eram crianças e adolescentes com comorbidades, como cardiopatia, por exemplo, e infelizmente alguns tiveram morte como desfecho”, explica Palmieri.
Para Vera Magalhães, infectologista e professora de doenças tropicais da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), a escassez de imunizantes deve ser levada em conta na hora de iniciar uma vacinação desse público.
“O ideal é que houvesse uma vacinação rápida e o mais abrangente possível, já que só quando tivermos 80% da população vacinada é que vai haver uma diminuição da transmissão viral. Mas diante da escassez de vacinas que a gente enfrenta, tem que priorizar as faixas etárias e as pessoas que têm maior risco de morte, mais risco de hospitalização”, avalia.
Conteúdo produzido pelo VivaBem
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