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por Bernardo Fellipe Seixas / Jornal Biz
Uma categoria que não pode parar durante a pandemia de coronavírus é a dos profissionais da saúde. A Portaria 639, de 31 de março de 2020, publicada pelo Ministério da Saúde, criou um cadastro para todos os profissionais da saúde no país (médicos, dentistas, fisioterapeutas, enfermeiros, atendentes), que deverão ser capacitados para o enfrentamento ao vírus.
A vida de todo o mundo mudou com a epidemia. O isolamento forçado cria novas formas de estar perto dos amigos e familiares, e a internet auxilia no processo de aproximação. Professores preparam aulas online, músicos criam lives e, na impossibilidade de reunir grupos de pessoas, até velórios online estão acontecendo. Tem quem acredite que sairemos melhores desta crise, menos individualistas. Até porque o isolamento, além de proteger cada indivíduo, também contribui para que outros não sejam contaminados. Assim, adultos e crianças se isolam para proteger idosos e doentes, numa situação solidária não muito comum até pouco tempo atrás.
O Jornal Biz entrevistou profissionais da saúde da região que trabalham em diferentes locais do país, para saber como estão enfrentando a crise provocada pelo coronavírus, e as mudanças na rotina.
A dra. Gabriela Fleury Seixas é professora do curso de Odontologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL), especialista em saúde coletiva e odontologia hospitalar, continua trabalhando na Bebê Clínica, que funciona como Pronto Socorro Odontológico: “Só atendemos casos de urgência, as consultas eletivas foram canceladas. O risco de contágio em dentistas é mais alto do que em médicos. Trabalhamos com aerossol (solução que se dispersa no ar formando uma fina névoa) e ficamos muito próximos da boca do paciente, em contato direto com sangue e saliva”. Gabriela é casada com um dentista que também mantém suas atividades normais, e a família está separada por causa da exposição e do risco que correm: “As crianças estão na casa da avó, todos em isolamento. Não temos contato com eles para evitar contaminação”.
Ela conta que os EPIs (equipamentos de proteção individual) mudaram por causa da epidemia: “Quando é preciso usar o aerossol usamos a máscara N95, o escudo facial, o jaleco é descartado a cada atendimento, a higiene no local é redobrada. Na UEL estamos seguindo o que os chineses publicaram sobre os protocolos para atendimento”.
Uma prática que está sendo utilizada pelos profissionais da saúde é a telemedicina. “Os casos menos severos são atendidos através da telemedicina, é feita uma triagem à distância antes de se pedir para que venham ao consultório”, explica Gabriela.
A telemedicina também é utilizada há algum tempo pelo Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, local de trabalho do médico santa-cruzense Fábio Dezo. Atuando na área de Medicina da Família, Fábio atende a pacientes e familiares de pessoas que trabalham em empresas que são conveniadas com o hospital. “Num primeiro momento da epidemia os ambulatórios de medicina da família começaram a bombar, o número aumentou absurdamente, todo problema respiratório gerava muita ansiedade e o sistema começou a superlotar. Em seguida, as empresas conveniadas começaram a entender a importância do isolamento, e instituíram uma política de home office de maneira expressiva. Então, os consultórios que funcionam dentro das empresas, in company, começaram a experimentar um movimento de esvaziamento, o que incentivou a prática da telemedicina”.
Para atender através da internet, foi formada uma equipe com médicos e enfermeiras que fazem a triagem. “Tínhamos três médicos, hoje são oito e a equipe de enfermagem também aumentou bastante. O fato das empresas colocarem os funcionários para trabalhar em casa e o Conselho Federal de Medicina ter autorizado motivou o crescimento do projeto”, explica Fábio.
Com a telemedicina, diminuiu consideravelmente o número de pessoas que circulam pelo hospital, o que ajuda a conter a disseminação do vírus. “Claro que, em casos mais graves, o paciente é encaminhado para o atendimento presencial”.
Fábio explica o que é o isolamento vertical, defendido pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido): “É o isolamento do pessoal doente e daqueles que tem fator de risco para desenvolver uma doença grave. É o modelo menos defendido pelos epidemiologistas e estudiosos, porque basicamente não consegue frear a contaminação de maneira significativa. Na prática não se consegue fazer o isolamento, o vírus continua circulando”.
O isolamento horizontal, defendido pelo médico do Hospital Sírio Libanês, “consegue frear melhor o vírus, embora também não totalmente. Não existe um modelo perfeito, mas esse é o mais defendido pelos epidemiologistas. O governo do Estado de São Paulo também defende essa postura, e eu considero acertada”.
Seguindo orientação do Ministério da Saúde, nem todos os casos que são notificados, apenas os que apresentam síndrome respiratória aguda grave. Fábio expõe a gravidade da situação: “Só os casos graves são testados, não existe teste suficiente. Muitos casos graves não estão sendo testados, principalmente em hospitais públicos. Isso faz com que a nossa curva não seja real. Estamos seguindo o caminho da Itália, mesmo com tantos casos subnotificados. Nossa situação é muito séria”, lamenta, concluindo que “Quando o Ministério da Saúde passa a tomar posturas mais políticas do que técnicas, a manipulação de dados é mais preocupante. Já vivemos isso quando o Bolsonaro exonerou o diretor do INPE por conta de uma divergência política no momento em que foram divulgados os dados de desmatamento na Amazônia. Eu me preocupo que isso também ocorra na área da saúde neste momento”.
O médico ourinhense Pedro Teixeira está vivenciando a crise do coronavírus bem longe de sua cidade. Trabalhando em Belém do Pará em dois hospitais privados, o Hospital Porto Dias e o Adventista de Belém, ele conta que a doença demorou mais para chegar até lá. “A epidemia chegou aqui umas duas semanas depois que em São Paulo. Então estamos acompanhando a forma como eles estão lidando lá, para ver o que dá certo. Também acompanhamos o procedimento feito em outros países. O ruim é que temos mais dificuldades em conseguir os equipamentos de proteção individual, as EPIs, é uma correria porque todo mundo tá precisando. Porém, para nós ainda não falta”.
Algumas mudanças foram implementadas na rotina dos hospitais onde Pedro atua coordenando as UTIs: “Foram criadas mais duas UTIs e um andar inteiro do prédio foi isolado, criando um bolsão para pacientes suspeitos de contaminação por coronavírus. As visitas não são mais presenciais, estamos fazendo via web. Os familiares conseguem ver o paciente usando um tablet, e os boletins médicos também são divulgados desta forma. Existe um elevador no prédio que foi reservado somente para acesso ao andar dos “bolsões”.
Outra medida para preservar os profissionais e familiares foi tomada por um hospital onde Pedro trabalha. A entidade alugou um hotel para abrigar os funcionários, e desta forma preservar seus familiares de possível contágio. “Os profissionais preferem dormir no hotel, evitam ir para casa. Os que tem mais de 60 anos ou fazem parte do grupo de risco foram afastados”, relata, contando sua preocupação também com seus familiares em Ourinhos.
Segundo Pedro, em Manaus o sistema de saúde deve entrar em colapso em pouco tempo. “Imaginamos que o tempo quente e úmido da região pudesse diminuir a transmissibilidade, mas não é isso que está acontecendo. A situação lá é muito feia”.
Pedro contou que a perspectiva de crise serviu para renovar e motivar a equipe médica: “É um ambiente de guerra, todo mundo preparado para o pior, mas muito animados e dispostos. Isso motivou os profissionais da saúde, todos nós nos sentimos úteis. Temos recebido muito treinamento para estarmos preparados para tudo o que aparecer”.
Pedro aconselha: “A população precisa ficar atenta. Isso que o Presidente falou das pessoas irem para a rua… pra mim ele é louco. Se não houver isolamento vai morrer muita gente”.
Em Ourinhos, com 152 casos suspeitos e até o momento nem um confirmado, os profissionais da saúde redobraram os cuidados para evitar contaminação. “Nossa vida mudou, como a de todo mundo. Chego em casa e não posso abraçar minha filha e minha mãe, sabemos dos riscos”, diz a enfermeira Janaína, que trabalha na Santa Casa e na UPA em Ourinhos. Seu nome verdadeiro foi modificado para proteger sua identidade.
Ela contou que na UPA foi preparada uma área de isolamento só para pacientes com suspeita de contaminação pelo vírus Covid-19. “Recebemos treinamentos constantes, e usamos os EPIs necessários. Não existe falta de material de proteção, mas mesmo assim temos conhecimento de funcionários que estavam com suspeita da doença, mas não foi confirmado”.
Ourinhos está se preparando para enfrentar a epidemia: O prefeito Lucas Pocay (PSD), com recursos do governo do Estado de São Paulo, está criando 56 novos leitos no prédio do Grande Hotel, 20 no antigo Hospital Psiquiátrico e mais 20 na UTI da Santa Casa. O hospital Unimed está instalando tendas em torno do prédio, para aumentar a capacidade de atendimento.
Na semana passada, várias cidades brasileiras fizeram “panelaço” para aplaudir os profissionais de saúde, principais combatentes na guerra contra o coronavírus.
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