Pai Sidney, que assina Sid ty Logunèdé, do terreiro afro-brasileiro Ilê Asé Omi Ojú Arô, é um homem discreto. Católico praticante, de família tradicional ourinhense, nem de longe lembra a figura estereotipada de um pai de santo.
Para o pai de santo ou babalorixá, como são conhecidos os sacerdote das religiões de origem africana, o ano novo não vai ser fácil. “Os caminhos estão abertos para continuidade de projetos que ficaram travados este ano, mas é preciso cautela com as finanças”, ensina, com o conhecimento adquirido no jogo de búzios. Na saúde, Sidney prevê aumento nos casos de câncer e alcoolismo, o que pode levar a discórdias familiares. “Infelizmente também haverá aumento no número de suicídios entre adolescentes”. Segundo Sidney, na política, haverá “continuidade na bagunça”.
“O que as pessoas precisam este ano é falar menos. Os dois últimos anos foram de muita discussão, é preciso ponderar. As pessoas gritaram muito, e agora pode acabar em morte e tragédia”.
Mas o ano não trará só dificuldades. Existem possibilidades de continuidade em projetos que ficaram estacionados em 2017, e de harmonia no amor, se houver diálogo.
“Eu sou otimista, eu acredito. Vou lavar a casa e esperar o ano novo, jogar fora a energia ruim e renovar. Não consigo mudar a cidade ou o país, então vou tentar mudar dentro da minha casa. É a primeira transformação que as pessoas poderiam fazer”.
Fazer uma limpeza caprichada separando o que não vai mais ser usado, lavar cortinas e louças e até pintar a casa são hábitos comuns das famílias brasileiras na passagem do ano, além do uso do branco no vestuário. Você pode não imaginar, mas esse costume vem do candomblé, que tem milhões de seguidores no Brasil.
Sidney contou que conheceu o candomblé quando jovem, enquanto lutava com uma doença grave. “Minha mãe recebeu um conselho para me levar a uma Casa de Candomblé. Fiquei curado do tumor cerebral, e resolvi estudar mais sobre o assunto. Já fui para a África, fiquei 20 dias pesquisando, e este ano quero retornar para aprender mais sobre os orixás”.
A Casa de Culto e Candomblé que pai Sid fundou no Jardim Ouro Verde já tem 30 anos, e tem frequentadores de diversas religiões.
Ele explica que os orixás presentes no candomblé não são santos como os que existem na religião católica. “As pessoas interpretam assim, fica mais fácil entender do que o abstrato. Não temos essa parte de espírito, nós cultuamos a natureza: a folha, a água, o mar, o trovão, o raio… Esta Casa de Candomblé onde estamos só não tem mar…. o resto da natureza nós temos referências aqui, até pedra de vulcão nós temos. Esses elementos são energias que nós cultuamos. Energias do mundo, aqui temos um pouco de cada coisa”.
A culinária tem grande importância nos rituais do candomblé, e os adeptos fazem restrições a alguns tipos de alimentos. A comida representa a união, é o encontro, a conversa, o prazer. “O alimento é fundamental para a qualidade de vida. A observação me ensinou que muitas pessoas têm problemas por causa dos hábitos alimentares”.
Os jardins bem cuidados e o silêncio trazem tranquilidade e bem estar para quem visita a Casa de Candomblé, no Jardim Ouro Verde. Apesar das notícias que mostram o aumento das agressões a membros de religiões afro-brasileiras, Sidney garante que não sofre preconceitos de outros grupos religiosos: “Tenho vizinhos evangélicos e me dou muito bem com eles; não sinto preconceito e converso com todos”.
Sobre o fato de se declarar católico, o babalorixá confirma a afirmação do sociólogo Reginaldo Prandi, professor da USP e pesquisador das religiões, que afirma ser o sincretismo religioso uma característica dos cultos de origem africana. “É mais fácil encontrar o catolicismo no terreiro, do que o terreiro no catolicismo”, constata o professor.
O babalorixá finaliza a entrevista com sabedoria: “O que poderia ser feito para diminuir as dificuldades previstas para o ano novo é a coisa mais difícil do mundo: as pessoas se gostarem e se respeitarem… só desta maneira podemos mudar, é o amor e o respeito imperarem no mundo. Quanto a isso, os governos não podem fazer nada. A transformação precisa acontecer dentro das famílias”.