“Sem opção de emprego, guardinhas podem até ir para o tráfico de drogas”, diz Orientadora

"Guardinhas" fizeram foto em protesto ao fim da atividade da Associação na Zona Azul. | Foto: internet

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por Bernardo Fellipe Seixas / Jornal Biz

Rayane Prado entrou para a Guarda Mirim de Ourinhos aos 15 anos de idade. Formada em Enfermagem, hoje, aos 21, é orientadora da Associação Mirim de Ourinhos (AMO SIM), e está preocupada com o futuro da entidade.

Essa semana o prefeito Lucas Pocay (PSD) enviou projeto de Lei à Câmara Municipal para criar a Zona Azul Digital, e a votação deve acontecer na próxima segunda-feira, 4.

Na prática, significa que o prefeito quer privatizar os serviços de venda de talões para estacionamento na região central, e os 100 adolescentes que fazem esse trabalho através da AMO-SIM serão afastados.

A orientadora Rayane está preocupada com o futuro dos adolescentes da Guarda e da Associação.

Rayane conseguiu uma bolsa integral no curso de medicina na Universidade Nacional de La Rioja, na Argentina. Até o início das aulas, em fevereiro de 2018, ela trabalha na supervisão da Zona Azul e tenta amparar, com a experiência de quem ajuda no sustento de casa desde muito nova, os adolescentes da guarda mirim, que vivem momento de angústia em Ourinhos.

A Associação Mirim de Ourinhos e Serviço de Integração de Meninas (AMO-SIM) usou as redes sociais para comunicar o fato, que vai atingir o principal trabalho que realizam hoje, que é a coordenação da chamada zona azul.

“Será o fim do trabalho dos guardinhas e, provavelmente, também da Associação, porque os poucos recursos que a entidade possui vem da Zona Azul. Não tem como oferecer serviços para a população sem a garantia de ter verba alguma”, diz Rayane, que alerta para o risco dos jovens “demitidos” irem parar na criminalidade.

“Muitos vem conversar com a gente, pedir ajuda. São de famílias humildes, que precisam daquele dinheiro para viver. Dizem que sem o emprego na guarda só vão conseguir algum dinheiro para o sustento da família atuando no tráfico de drogas”.

Formatura de Guardas Mirins 2017. | Foto: Assessoria AMO-SIM

O cenário atual já mostra isso. Desde os últimos meses da gestão Belkis Fernandes (2013-2016), a prefeitura vem demitindo estagiários do CIEE (Centro de Integração Empresa-Escola) e da AMO-SIM. “Tenho uma amiga de 18 anos que saiu da Associação no começo deste ano. Ela tem a mãe deficiente física, o pai está preso e ela tem que cuidar da irmã de 9 anos. Só recebendo o Bolsa Família, infelizmente, no desespero da falta de dinheiro, entrou para o tráfico”.

Em vez de pessoas, máquinas “atenderão” quem precisar da Zona Azul em Ourinhos.

Bem informada também sobre a política local, Rayane acha que a situação é definitiva. “Os guardinhas vão fazer manifestação na Prefeitura na manhã de segunda-feira, mas não sei se vai adiantar. Pelo menos 11 vereadores votam a favor de tudo o que o prefeito manda, e mostram compromisso somente com seus interesses pessoais e não do povo”.

Casa dos parabéns

Com maioria absoluta na Câmara Municipal, todos os projetos apresentados pelo Prefeito têm sido aprovados sem questionamentos.

Há alguns meses o assunto tem sido discutido, e a possibilidade da Associação Mirim precisar demitir os “guardinhas” desagradou os familiares e pessoas que conhecem o trabalho da entidade, que atua na cidade há 60 anos. Apesar de Lucas Pocay ter assinado em setembro comunicado conjunto com a Associação Mirim afirmando que o assunto seria objeto de estudos e reuniões que aconteceriam com a presença da entidade, o prefeito não cumpriu sua promessa.

Segundo o comunicado, a Associação Mirim informa que “foi acordado que seria criada uma comissão que discutiria o projeto da nova Zona Azul e a viabilidade da municipalidade de encaminhar mais aprendizes aos setores públicos da prefeitura. Porém informamos que não participamos do referido projeto, apesar de termos indicado membros para participar da Comissão”

Elogios mútuos e falta de coragem para discutir assuntos polêmicos e importantes rendem à Câmara Municipal de Ourinhos o apelido de “Casa dos parabéns”.

Eleito com amplo respaldo popular, Lucas Pocay tem mostrado pouca disposição ao diálogo, amparado pela maioria dos vereadores que aprova os projetos encaminhados sem nenhum questionamento. Pela atuação adesista e elogiosa à atual administração, a Câmara tem sido chamada de “Casa dos parabéns”.

Resta saber se os vereadores vão aprovar o projeto que na prática pode acabar com a Associação Mirim, já que alguns deles começaram a vida profissional como “guardinhas”.

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